Samuel Rama
Samuel Rama (n. 1977, Coimbra)
Magma Suspenso, 2008-2010
(árvores de cipreste, pó de argila, barro fresco e estrutura de aço, numa área de 3000 x 3000 x 4000 cm)
MAGMA SUSPENSO
A ideia tradicional pictórica de paisagem persiste na obra de Samuel Rama. Socorrendo-se de inúmeras estratégias – desenho, pintura, escultura e instalação – o artista concentra-se na relação entre o observador e o objecto observado.
A peça que Samuel Rama actualmente apresenta na Casa-Museu dos Patudos, em Alpiarça, inserida na Trienal do Vale do Tejo, Magma Suspenso (2010), reporta-se à primeira exposição individual realizada na Galeria 111 – Lisboa e Porto, respectivamente em Março e Junho de 2008. À data, a obra Magma (2008), composta por 4 ciprestes revestidos com pó de argila e barro fresco e recolhidos da construção de uma auto-estrada, ocupava o espaço central da galeria, e colocada directamente sob o solo, desenhava um percurso que interferia com o visitante. Neste caso, a instalação escultórica questionava a utilização do tema da paisagem como forma de estabelecer um domínio ou um percurso sobre as pessoas que com ela se relacionavam.
Desta feita, em Magma Suspenso (2010), ao utilizar as mesmas árvores Samuel Rama desloca o entendimento da peça para um domínio mais complexo e promissor. As árvores são colocadas sobre uma estrutura paralelepipédica de ferro, a 2 metros de altura. Devido às condições do espaço expositivo, a obra pode ser vista de todos os pontos de vista, incluindo de baixo e de cima. Em relação a Magma (2008), a elevação de Magma Suspenso (2010) desloca amplamente o entendimento sobre a mesma obra. Se na primeira apresentação a “paisagem” e o espectador partilhavam o mesmo espaço, permitindo e obrigando o espectador a movimentar-se perante a “paisagem”, agora, mesmo que o referido movimento seja desejado, a “paisagem” encontra-se delimitada e encerrada no seu próprio espaço. Esta contenção tende a questionar o tema da paisagem como lugar inacessível e transcendente. A transcendência não se situa (encontra?) na sacralização do próprio objecto. Ao colocar a obra num pedestal aparente, o artista envolve o espectador na sua totalidade, relacionando-o com todo o espaço tridimensional.
O romantismo, sobretudo alemão, delineou a definição de “sublime” (Burke e Kant) como o deslumbre por algo terrífico, mas com uma distância segura que impeça o medo de se sobrepor à sensação de prazer. Assim, a paisagem tomava um papel importante na representação do sentimento “sublime” em que a pintura assegurava a distância necessária. Em Magma Suspenso (2010) Samuel Rama parece resgatar esta estratégia amplificando o risco de perigo iminente. A distância a que a peça se encontra do público e o seu enquadramento no espaço expositivo permite o pleno deleite da obra. Contudo, ao suspendê-la no espaço o artista acentua a possibilidade da queda tornando-a, deste modo, ainda mais temível.
A narrativa é outro factor preponderante a ser analisado. Em Magma (2008) a apresentação das árvores pressupunha uma narrativa temporal, balizada entre a história das próprias árvores, a acção que de que foram alvos e a sua colocação num espaço fechado, bem como o tempo e o espaço percorridos pelo espectador. Em Magma Suspenso (2010) esta narrativa parece estar congelada num determinado momento incerto. A suspensão da narrativa é firmada pela delimitação da obra ao seu espaço físico. Por isso mesmo, a peça não pressupõe um acontecimento anterior nem uma história. A ausência de narrativa explicita uma refinada apresentação de uma mera paisagem que coloca o espectador no seu papel de observador, na esperança que este relacionamento proporcione um entendimento entre ambos.
Hugo Dinis, Setembro 2010
Co-Produção: nada na manga – associação/Trienal do Vale do Tejo